sexta-feira, janeiro 29, 2010

Não há nada

Não há estrofes nestas poesias
Não há métrica nesta minha vida
Não há conto neste meu dilema
Não há drama nesta minha paixão
Não há gênero, nem estilo
Não há lira, nem lirismo
Neste mar de sabe nada
Não há truque nem retoque
Não há nada neste fado
É um ruído, uma voz
Um tom e um som
No embalo desse timbre.

quarta-feira, janeiro 27, 2010

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Deita-se o mormaço por sobre o asfalto da cidade
Um som abafado de guitarra permeia a noite
Emitido de um pub barato, cheira a pinga de esquina
Num solo ecoa pelo silêncio dramático da escuridão
Invocando a solidão dos becos, dos desamparos
Bafejam gazes venenosos dos bueiros, expelindo insetos, injurias
Ateando fogo nos corpos à mercê do cenário de horrores
Partículas ardentes que soltam de si as matérias em combustão
Morada dos justos, estilo hodierno, corpos revestidos de crómio, corações de uretano à prova de quedas, riscos e solavancos. À prova de vida, condições desumanas.
Suas almas rechargers perecíveis, suscetíveis à esteira do tempo, condenadas, obsoletas
Delas sopra uma trilha, sonora emoção, lenda, paixão humana a resistir em meio a artifícios, fogos forjados, desejos moldados, num rio metálico, pesado, vergado, compadre nocivo
Um suspiro afoga a todos nós, um chamado, uma cura, um destino implacável, sê forte, sê duro.
Pois haveremos de ser, padecer e perecer.

quinta-feira, janeiro 14, 2010

Passando

Não se assuste assim
Não se apresse assim
Não se desespere assim
Assim tudo passa tão depressa
Assim tudo é passado
Vá com calma
Um passo de cada vez
Os passos vão passando
Passeando e se tornando passado
Eu digo e o que digo se passou
Tudo vai passando e passado virando
O passado vai crescendo e passando
As saudades vão crescendo e ficando
Tente não se preocupar, nos veremos adiante
Leve apenas o que precisar e nos veremos um dia
Deixe passar, para seguir em frente e passar adiante
Lembre-se, pois isso irá passar e então seremos lembranças
Seremos lembrados, seremos passado, seremos saudades
Seremos eternos, seremos o perfume da noite, o arrepio febril, a nudez das árvores, a brisa do mar, o calor do verão
As gerações que se passaram e deram lugar àquelas que irão passar
Estaremos em todo lugar, assim como o passado que carregamos e que nos vai levando do presente para o futuro, numa locomotiva a viajar, num balão a voar
Um olá vem trazer e um adeus vem deixar, para mais uma história continuar.

sexta-feira, janeiro 08, 2010

Sonho

Sonhei que era noite e que a chuva ameaçava cair, então pensei em correr até lá fora para ver a água cair.
Estava tudo tão quieto, apenas o barulho do vento que trazia a chuva e na escuridão as luzes da calçada dançavam sozinhas isoladas cada qual num círculo apartado.
Lembrei-me de que no passado as copas das árvores cegavam as luzes dos postes. No sonho, passado e imaginação se mesclavam e criavam um cenário perfeito como sempre sonhei que seria minha casa, meu lar, meu lugar, mas é apenas um sonho, o meu lugar é apenas um sonho.
Nele as coisas flutuam leves no ar e num salto vou de um pavimento ao outro, nele o tempo inexiste e é noite ou dia, basta querer. Subi até o topo da imaginação e chamei: Pingooooooooo
Do outro lado, quem era aquele que olhava assustado?
De cá, quem era a moça que chamava no escuro?
No sonho posso ver quem quer que seja, nem que seja para dizer adeus.
Chamavam-me ao telefone, mas não havia ninguém do outro lado da linha, era apenas uma expectativa de que algo estava prestes a acontecer, quem sabe um convite para viajar, um olá, um adeus, um matar de saudades, daquelas que só um abraço pode resolver.
Se chamarem por mim estarei lá, basta querer, é um sonho, é tudo um sonho e estou lá.

quarta-feira, janeiro 06, 2010

É noite

É noite e ando só
Não há nada além do silêncio
Do frio que sopra devagar
Me despertando de um sono eterno
O céu desenha um tempo passado
Tudo ao redor existe
Meu coração cavalga a galope
Tudo é
O universo me toca e me toma
Me consome de uma só vez
De mim irradia calor, é infinitamente humano
Uma paixão negligente, insensível a dor,
Deseja se confundir
Numa só chama se dissipar
Num descuido, em descompasso
Meu corpo plena luz a queimar, consumindo a escuridão
Quero dançar absoluta nos limites do tempo, estou apaixonada, determinada
É tão grande que não posso conceber, peço perdão, quero de tudo me desvencilhar
Os laços rijos do tempo me arrastam de volta, violento, sonoro de volta ao vazio
À ausência, à escassez, à sede infinita, insaciável cortejo do tempo
A ordem do tempo se cumpre, mais um ciclo se encerra
E lá se foi o tempo na noite a voar...

domingo, dezembro 27, 2009

Pingo

Foi na véspera, meu companheiro
Vi que estava cansado, seus olhos parados já não brilhavam mais
Aconselharam-me escolher, já não havia mais jeito
Meu companheiro já não poderia voltar para casa
Uma dor silenciosa pairava, demorada como os suspiros que dava
Meu amor era maior que o egoísmo que o impedia de partir
Amigo, as flores que plantei, de você se alimentarão e por você florescerão
Para que celebrem a vida que foi sua
E então, deixei que se fosse, para nunca mais voltar

segunda-feira, dezembro 21, 2009

Uma corda no mar

A corda solta paira
Embebida, morada de musgos
Enegrecida, apodrecida
No cais do porto
Vaga uma corda solta
Sucuri engolfada
Levemente boia
Traça um caminho na água
Sozinha corta o horizonte
E se perde no mar