quinta-feira, abril 09, 2009

Nevasca

O arrasto das rodas me aterroriza
Flocos de neve debatem-se
Uivam lá fora
Ah, por Deus, não posso parar
A paisagem irá me engolir
De um branco angustiante
Maldita ilusão em cartões postais
Lembro-me dos enfeites de natal
De como são reconfortantes
Do calor que transmitem
Em datas especiais
Salpicados em branco plástico
Mantenho a perspectiva
Desde o começo procurei um suporte
Ancorando-me em memórias
Mas este porto é tão remoto
Como pesa o ar aqui dentro
Um carro dança no gelo
As correntes tilintam
A cada avanço na estrada
Um recuo do sol
Crepúsculo perverso
Vem a galope
Arauto funesto
Gelando-me o sangue
Exaurindo-me as força
Um suspiro escorrega
Da garganta profunda

quinta-feira, abril 02, 2009

Mundo

Mundo
Toque
Toque para mim sua canção
Mostre
Mostre para mim a sua luz
Diga-me
Diga-me tudo o que você tem a dizer
Não se esconda de mim
Dance
Dance sua música para mim
Leve-me
Leve-me embora para todo lugar
Abrace-me
Abrace-me forte
Fale comigo em sua língua
Em todas as línguas que você aprendeu
Em todas as línguas que você ensinou
Em todas as línguas que você experimentou
Mostre-se para mim
Mostre-me seu verdadeiro potencial
Mundo, você é meu mestre
Você é meu pai
Minha mãe
Meu irmão
Meu amante
Mundo mostre-me tudo o que você é
Não se esconda
Seja tudo o que você realmente é
Então, depois escolha o que é melhor
Ser o que você é
Ou ser outra coisa
O que é melhor?
Viver morrendo
Ou simplesmente viver
Mundo
Diga-me
O que você pensa?
O que há de errado com você?
O que há de errado conosco?
Com você e comigo
Com você e todos nós
O que há de errado?
Como você se sente a respeito de tudo?
Mundo mostre-nos o mundo como ele realmente é

quinta-feira, março 26, 2009

Tentando buscar

Estou tentando continuar
Continuar buscando
Mas quando acordo
Quando me levanto
Quando me deparo comigo
Procuro encontrar qual busca seria a minha
Uma busca, um intuito, um caminho certeiro
Uma busca que não está aqui dentro de mim
Ela há de estar lá fora, precisa estar
Pois aqui dentro não pode estar
Aqui dentro a busca não se encaixa
Não se encaixa às buscas disponíveis do mundo lá fora
Lá fora não tem espaço para o que existe aqui dentro
Ou será que aqui dentro não há espaço para o que ofertam lá fora?
Para que eu possa me ajustar às opções oferecidas lá fora
Às propagandas que fazem, de que a vida acontece lá fora
Minha vida está acontecendo aqui dentro
Lá fora minimizo esta vida, sufoco esta vida
Para que a vida que lá fora me ofertam se encaixe aqui dentro
Lá fora posso trocar de vida, se não gostar desta ou daquela
Experimentar tantas vidas quanto quiser
Até encontrar aquela que me faça aceitar as coisas como elas são
As coisas como são é a vida que nos vendem
Os chicletes têm o que gosto que tem e se não lhe agrada
Busque os da concorrência
As ofertas nos parecem infinitas
Mas são um limite
Barreiras
Por trás das barreiras estamos todos à espera
Em busca do que nos oferecem
Mas e quanto às coisas que não podem nos oferecer?
Quanto àquelas que não têm como nos oferecer?
Estas vamos deixando de lado, vamos esquecendo
Deixando-as morrer pelo caminho que nos foi ofertado
Pela ordem que rege lá fora
É preciso se adaptar
Se moldar
Mas não é isso o que somos
Um pedaço de barro que se possa moldar
O que somos talvez não represente um modelo
O que somos são todas as coisas
Porque o que somos está vivo e em movimento
É fluido e não estático
O que somos simplesmente é
Independente das inúmeras identidades que possamos adotar
Trocar, buscar, representar
Não há respeito pelo que somos
Pois o que somos está além do respeito
As buscas que precisamos buscar
Já foram encontradas
Do contrário não estariam expostas em uma vitrine
Existem aqueles que não querem as buscas
Mas alimento
Alimento para que seus corpos possam sobreviver
Aqueles que não se ajustam às buscas
Que estão à margem dos sonhos
Das incríveis realizações
À beira da morte
Existem aqueles que são...
E aqueles que se vão...

sábado, março 21, 2009

Fel da vida

Lamentável é não enxergar para além dessas paredes
Acredite. O horizonte fica preso aqui na garganta
E a fome deixa de existir
Assim como o contentamento se estende em frustração
Pagando o espaço físico ocupado
Preso a uma terra de promessas
Num labirinto insensato
Numa redoma caótica
Em meio a toda essa retórica furiosa
Endurecida em palavras lapidadas
Derramando verbo absoluto
Ardendo como sal no lume
Revertendo antinomias
Tombando abaixo do consenso
Patenteando uma pobreza chapada
Gravada e enfeitada
Em propagandas prostitutas
Hipocrisia das mentalidades
Cristalizando o fel da vida

sábado, março 07, 2009

Aida

Aida acorde
Venha até aqui
Estou aqui fora, no jardim
Estou a sua espera
Venha...
Ainda é cedo Aida
Sinta...
Sente a brisa marítima,
Soprando ao pé da orelha?
É para você Aida
Um sopro harmônico
Do mar para você
De longe toca uma canção no rádio
Daquelas que te faz vibrar
No íntimo você quer dançar
Dance comigo Aida
Dance comigo...
Sua dança traz o mar para perto
Ele avança manso e se arrasta a seus pés
Aida é pura música
Gira no ar como um anjo
Sorria Aida, o sol nasceu para você
A sinfonia são seus passos
Seu rosto iluminado
Aida você nasceu para brilhar
É tão fácil se encantar
Por Aida
Aonde quer que você vá
A luz irá te buscar
As estrelas irão te procurar
O mar irá te abraçar
Com a força da maré
Num campo gravitacional
Ideal para que Aida erga-se com as ondas
Aida orbita no universo
Acima das constelações
Para além de galáxias distantes
Aida seu corpo é dança
Sua alma é música
É a harmonia do cosmos
Aida é mais do que posso dizer

segunda-feira, março 02, 2009

De pé

Você está desmoronando
Aguente firme
Parece não haver jeito
Aguente firme
Respire fundo
Não chore agora
De que adianta lamentar?
Peça, feche os olhos, faça um desejo
Não diga nada
Respire fundo
Não chore, prometa
Estenda a conversa para compensar o silêncio que se estenderá noite adentro
De pé
De pé
Engane a espera
Mas a espera se estende noite adentro
De pé
A espera não se deixa enganar
Se estende vida afora
Respire fundo
Não chore
Fique de pé
Prometa que nada irá prometer
Lembre-se de si
Que irá se estender para além do espaço e do tempo
Um sussurro e o vento arreganha as janelas, estilhaça os vidros
E isso é só o desenrolar da história de todos que um dia ficaram de pé.

sábado, fevereiro 28, 2009

Arranhando paredes


Arranha paredes
Debate-se no chão
Esqueceu a lição?
Sabe dizer se é noite ou se é dia?
Aonde você vai?
Não me faça ir até ai
Não se preocupe, não se culpe, estamos aqui e ali
Sabe onde está?
Quem sabe possa dizer para onde você vai
Lá fora o sol está queimando, penetrando a crosta danificada deste planeta
E tudo o que você consegue fazer é se debater e arranhar as paredes deste aposento em decadência
Se pudesse sair, veria o sol
Pura luz a inundar tudo ao redor
E então quem sabe pudesse ver algo além de si mesmo
Erguendo-se para além das paredes