terça-feira, março 18, 2008

Pecado do amor

Vamos nos encontrar no cais de um navio prestes a afundar, ali me beijes irradiando certa dúvida, pois só assim lhe verei por dentro.
Se a noite for duradoura prometo lhe dizer palavras suaves até você dormir e quando isto ocorrer tomarei em uma taça fina de cristal, meu veneno favorito.
Em goles dolorosos a cicuta desce, marcando toda minha passagem por este mundo.
Quando acordares estarei a iluminar, como os raios do sol, sua face agora desamparada sem minha presença carnal.
Não me julgues, pois ao teu lado meu corpo não mais acordou.
Saibas que lhe devo o mundo e este lhe darei, repleto do amor que jamais pude conceber em vida.

segunda-feira, março 10, 2008

Pensamento

Não se permita pensar em outro que não este pensamento
Pensamento este que se estampa entre vários outros
Emana em infinidade
Como peças que se sobrepõe
Como círculos circunscritos em si mesmos
Rudimentos artísticos de labor mental
Incógnitas de uma expressão algébrica
Deixe que seja
Assim nasce na alma e deságua no corpo.

sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Saudade

Saudade é uma explosão que se dá de dentro para fora,
É alento de dor mergulhado no prazer da lembrança perpétua,
Silencioso vestígio de sua presença,
Irreparável ausência de sua pessoa.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Partícula

O canto de um pássaro num fim de tarde, conversas isoladas num canto.
Fotos congelando imagens em paralelo a uma memória esquiva, sem provas convincentes.
Um perfume que exala lembrança, vestígios não investigados.
Rumores, murmúrios, sons disformes flutuam no espaço e desaparecem como transeuntes no horizonte enevoado.
Não há nitidez a não ser pelas moléculas de água que contra a luminosidade existente, apresentam um formato supostamente arredondado.
Água: forma manipulável e volume fixo, fria, quente, morna contrapondo-se a prateleira de livros, duros, sólidos, maciços.
A partícula d’ água pousa sobre o livro provocando uma verdadeira revolução, vindo a evaporar.
O livro permanece o mesmo, intacto exceto por uma minúscula mancha em sua página.
O que pensava eu exatamente quando a vi pousar?
E os demais, que pensavam?
Quem mais além de mim a viu?
Seria sensato pousar meus pensamentos sobre as páginas de um livro como gotículas d’água que se precipitam causando uma tempestade a borrar as palavras impressas?
Minhas linhas junto de seus parágrafos se tornariam um só borrão de tinta sobre a superfície amarelada de uma folha de papel.
Amarelada, apagada, sem a melodia das folhas do outono, sem a riqueza dos raios de sol.
Pés que se arrastam abaixo da cúpula virtual, aspiram pelo ruído quebrado das folhas secas do chão outonal, assim como o sangue concentrado nas veias se projeta diluído em crepúsculo no céu.
Aqui e acolá permeio, atravesso, me exponho me fecho e restrinjo cingindo os sentidos a tona.

sábado, dezembro 22, 2007

Medo

Tenho medo.
Medo de mim e de todos os outros.
Medo de olhar e ver.
Medo de descobrir tudo que existe por trás deste rosto.
Medo de que esta expressão não exista.
Medo de que as lágrimas que rolam sejam ilusões.
Medo da angústia que corre dentro destes olhos.
Medo de assistir às provas entranhadas na superfície desta íris esverdeada e brilhante.
Medo de escutar esta voz.
Medo de ouvir o que tem a dizer para o reflexo no espelho.
Medo de perder o chão.
Medo de descobrir sobre esta natureza.
Medo dos crimes cometidos involuntariamente, deliberadamente cientes de si mesmos.
Medo dos resultados e diagnósticos.
Medo da escuridão que se perpetua.
Medo das falhas, erros, tentativas e posteriores acertos que acertam contas no futuro.
Medo das dívidas contraídas.
Medo das contribuições e transgressões.
Medo da conformidade, da realidade.
Medo da dor e da sujeira.
Meda da esfera de ação alcançada.
Medo do descontrole.
Medo do despotismo.
Medo da liberdade.
Medo de que tudo se desvaneça e desintegre as convicções e credenciais.
Medo da plenitude desconhecida.
Medo da incapacidade de admitir o medo.
Medo do medo.
Medo de viver com medo.
Medo de perder o medo.

quinta-feira, maio 24, 2007

Preocupações preocupantes

Preocupo-me quando comigo preocupam-se, porque assim em mim se exaltam preocupações preocupantes e me preocupo muito mais!
Não há portanto, com o que se preocupar, pois estou em perfeito estado mental, espiritual, intelectual.
Físico, corpóreo, material, natural, neural, emocional.
Cardíaco, maníaco.
Caduco, aluado, esquisito.
Excêntrico, lunático, paranóico.
Demente, decente, impaciente, paciente.
Exaltado, tresloucado, desarmado, apiado.
Desmanchado, manchado, rebocado, estilhaçado.
Abatido, arrebentado, arruinado.
Esfacelado, despedaçado, desalentado, arrochado.
Falido, fatigado, fendido.
Quebrantado e permutado.
Por fim preocupado.

quinta-feira, abril 19, 2007

Espaços vazios, linhas em branco.

Me definam, em algumas linhas do espaço em branco ou em todas elas, não ultrapasse a margem.
Me definam da forma que quiserem definir, sejam suas ideias e opiniões claras ou não, sejam elas baseadas ou não na realidade dos fatos.
Aqui a realidade não sou eu e sim vocês, portanto definam nas linhas vazias do espaço em branco o que sou, baseado em suas impressões e no que acreditam.
Definam se sou boa ou má,
Definam se sou tudo ou nada,
Definam se estou apta ou não,
Definam se amo ou não,
Definam se sou luz ou trevas,
Definam livremente através de um olhar que seja,
Definam, por favor, o que não sou capaz de definir,
Definam bem ou mal, afinal são vocês e não eu,
Definam no espaço em branco e nas linhas vazias, porém não ultrapassem as margens...
Nos espaços em branco e nas linhas vazias, vocês podem me definir, podem me desenhar, me escrever, me editar, me construir, me destruir, me reconstruir, me apagar, me colorir...
Onde não há nada todos podem tudo...
Preencham os espaços e as linhas vazias como quiserem.