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Os donos da verdade



Não sei que dia foi aquele
Aquele em que decidiram o que era certo e o que era errado.
Foi assim que começou
Cada um carrega dentro de si uma infinidade de valores que somados constituem uma “bagagem” pesada
Alguns se dispõem a arrastá-la consigo pela estrada da vida, acrescendo a ela cada vez mais verdades, teorias, assertivas universais
Aos poucos a alma se curva
Se curva diante das regras, das grades, das crenças, das imposições
Deixa de ser, torna-se dever
A verdade é ouro, mais absoluta certeza
Uma verdade se multiplica por dez e assim por diante, na medida em que vamos nos munindo dela para viver e conviver
As verdades se expandem para além das barreiras as quais nos impusemos e aos poucos começam por contornar as pessoas com as quais convivemos se espalham e invadem as vidas daqueles que ao nosso lado caminham e então se intensificam, se solidificam e falam por você, determinam para o outro como as coisas devem ser, se exteriorizam de modo que o mundo lá fora passa a ter de refletir o que você é ou tudo o que acredita ser.
A mente fica a tagarelar, a determinar, a reger o que não lhe cabe reger. As liberdades se estreitam cada vez mais, os horizontes diminuem e aos poucos beira o insuportável. Eis que nos surgem os desagradáveis donos da verdade.
Aqueles que se julgam aptos a definir o que é certo fazer e a partir disto, determinar para outrem as verdades que para si são supremas
Aqueles que insistem em nos dizer o que devemos fazer em meio a uma inutilidade de idéias pré-formuladas, baseadas em infalíveis verdades
Aqueles que pretendem impor o que são para aqueles que já sabem o que são
Seres fixos, estáticos que se aprisionam em suas próprias verdades e procuram aprisionar todos ao redor, formando uma longa cadeia de prisioneiros iguais, meros reflexos, sombras, apagados num caminho certeiro, verdadeiro, inevitável de repetições obsessivas.
Caminho viciado, circular, amarrado, dos arautos das verdades a seguir, das correções, da palavra ordeira, do conselho certeiro, do que deve ser.
A alma que se eleva ao pedestal infinito das verdades compreende o mais luminoso conhecimento das coisas. Torna-se o juiz que sentencia todos aqueles que se encontram desprotegidos das grades do saber que lhe pertence.
Seu mundo é o verbo da sentença, uma estrada bifurcada entre erros e acertos, uma verdade imposta, suposta realidade, tola ilusão.
Hão de conhecer a liberdade de escolha, a imprevisibilidade das coisas, as diferentes nuances das almas, a diversidade, a transitoriedade das coisas, as metamorfoses que se dão a cada segundo de nossas vidas. Tudo difere. A beleza não é perfeição é o aprendizado, que modifica as coisas, é algo que não molda, mas que pulsa e vive em uma eterna transformação.

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