domingo, novembro 08, 2009

Sossego

No fim da tarde
A cigarra começa a cantar
As copas das árvores começam a dançar
Eu me sento sobre o toco de tronco rachado
Olho distante esse mundão que parece dormir
E um pouco de paz a que tanto aspiramos me chega ao coração
Mal posso fechar os olhos com medo de abri-los novamente e meu mundo se desvanecer.

terça-feira, novembro 03, 2009

Paisagem

A neblina cobre as montanhas que cercam a cidade
Revelando aos poucos seus contornos irregulares
Na orla o mar se ergue como um colosso, deitando-se sobre as areias profanas do vasto formigueiro de saúvas.
À suas costas abre-se um recôncavo impedido pelo aterro, águas insalubres tingidas de negro petróleo, submetidas à vontade humana.
Superfície tremulante, dotada de um sossego letal.
Persiste uma paisagem fingida, como o frescor das flores mortas de um ramalhete.
Simulacro da vida que aos poucos se esvai.
Maravilha desgraçada e poluída. Destroços de um sonho vencido.
Paisagem, desenho borrado, passatempo para aqueles que se põem a admirar aterradora ficção.

terça-feira, outubro 27, 2009

Agora

A noite chegou
E com ela veio o silêncio dos dias de domingo
Algumas pessoas falam na calçada
O relógio é uma arma apontada para minha cabeça
Desvio o olhar, não quero pensar no amanhã
Quero o agora, a quietude do instante, a leveza do presente

domingo, outubro 25, 2009

Pressão atmosférica

Meu olhar se alinha entre as grades de ferro para ver o tempo chegar.
A beleza que apreendem é a beleza do mundo que se estende além dos prédios da cidade.
As nuvens viajam pesadas, pairando acima das montanhas rochosas, vêm confirmar a previsão meteorológica.
Estou ainda na fronteira entre o previsto e a evidência, o fato segue independente das fronteiras do saber.
Olho a paisagem tentando não traduzi-la em verdade, deixo prevalecer as sensações que os olhos não concebem, e então, sinto o dia virar noite.
A cidade perde seus contornos projetados em linhas retas, curvas sólidas, abrindo espaço à imensidão do mundo e o frenesi concreto revela sua insignificância.
Carne humana, ruído mecânico, brisa mista de gazes tóxicos, confinados em uma panela de pressão.
No silêncio irrompe o grito da multidão, matéria bruta convertida em mercadoria. Impassíveis, utilitários, aparentemente saborosos, servidos prontos para o consumo.
Aqui tudo acontece sob a lei da pressão atmosférica, lá fora o silêncio e a escuridão, o universo imensidão, engolem a exiguidade de um planeta azul.

sexta-feira, outubro 16, 2009

Sono

Era noite e nossos olhos quase fechavam
Chovia e nossas bocas calavam
O mundo acontecia lá fora
Pessoas sorriam, corriam, se escondiam
E em nós morava o silêncio infinito
O sono pendia sobre nossas cabeças
A respiração varava o peito
Ungia-nos o calor da concórdia
A quietação dos ânimos
Duas almas pachorras
Sossego nos quartéis e conventos
Rogamos para que fosse justo
E então nos entregamos em paz

segunda-feira, outubro 12, 2009

Centelha

Brilho celeste
Fogo azul do céu a cair
Desliza silente o espaço fluído
Até tocar num estrondo o solo
Se expande num clarão, feito flash a cortar o chão
E o estouro se mescla a tremores terrestres
Condução do céu a terra
Nuvens alta voltagem
A vibrar, a chorar, a regar
A vida vem trazer
Do infinito às fronteiras do meu breve olhar
Então a imensidão dançou diante de minha insignificância
E tocou a canção de um tolo coração, miserável a chorar

segunda-feira, outubro 05, 2009

Sonhei

Ontem sonhei com os milhares de dramas que permeiam a vida.
Em meio a inutilidades vis, preocupações meramente aparentes que se repetiam num circuito infinito.
Num mundo em que tudo pesa e o fardo cresce num feixe de doze estribas.
Baixei guarda, deixei-me o corpo conduzir, rumo às vontades voláteis.
A sede e fome de cada dia, quando o que queremos é saciar o infinito, conquistas em débito eterno.
Quando me volto para olhar tenho tudo acabado, num rumo outrora traçado vejo a estrada se adensar, vejo o tempo chamar, e o que vi foi a todos subir a bordo de minha lataria pesada, negra, reluzente a luz de um dia revolto.
Vagando num pensamento fantástico, maravilhas vazias num coco seco, nos aventurávamos num céu em chamas e o coração na mão, o perigo nos trazia de volta à realidade forjada.
Até que cada qual decidiu abortar sem norte, em profusão, a rosa-dos-ventos se rasgou e o sonho se achegou ao despertar.
Já era hora... Já era hora de acordar.